quinta-feira, junho 22, 2006

pintura a óleo

aoutra noite de inverno, fria... a sereia, imersa, não visitou-me. mais uma noite a espera, com o teu espectro pairando cabisbaixo e fixo em mim....
a rúcula estragando na geladeira. vou até a cozinha, acrescento palmito e tomate ao prato. como com hashis, mesmo sem vontade de fazê-lo. no entanto, preciso de energia!
ela deve vir, penso. mais hora, menos minuto ela já não tardará, cogito. passa tempo esquivo...! passa hora imprópria...!
o interfone toca. vou ver quem é...
ah, claro, como pudi ter esquecido? havia marcado uma saída! estavas lá embaixo e repudiavas esperar... eu não pude descer!
lamento, querido! não me sinto bem... não sei se foi a rúcula que comi mais cedo, mas, de fato, a sensação não é a mais agradável e um bar agora não me faria bem, posso assegurar-te de antemão! desculpa não te ter avisado antes; mas estive o dia todo ocupada...
e assim foi... consegui manter-me sozinha! pretexto: a rúcula! será que colou? eu não acreditaria que uma salada pudesse fazer alguém sentir-se mal a ponto de não poder sair de casa! talvez entendas, com essa improbidade, a minha metáfora... não me procures mais! não me fale de saúde pública e nem em termos de acordo! isso nada tem de vital nesse momento e, o que são os encontros senão um desejo nosso em obtê-los? não tenho nenhum desejo que se relacione com burocracias estatizantes agora! não tenho nenhuma vocação para mediar quaisquer reunião pela manhã! as minhas noites devem, e serão daqui pra frente, a busca por uma nova abordagem de mim! a busca por uma nova configuração para os meus sentidos. quero um corpo mais reflexivo! quero uma dinâmica mais tântrica!
e, para tanto, devo esperar que ela saia! devo esperar um aceno que seja no final dessa noite longa! deusa, oh deusa... vem inspirar-me, vem contribuir para um momento novo! usa meu corpo- objetaliza-me! não passo de um corpo-objeto ultimamente, penso muito nas necessidades dele, olho-me no espelho e todos os dias passo rímel! não deixo mais de providenciar as roupas sempre bem lavadas e passadas à vapor! não canso de experimentar a melhor combinação de calça e sapatos. quero sim, uma consonância em mim! dessas que ninguém mais percebe a não ser eu mesma! não é para mais ninguém que tomo banho e corto as unhas! não é para mais ninguém que eu mesma reparei hoje pela manhã as pontas dos meus cabelos!
quero que saibas que o que me trazes, o que espero de ti, já aponta em mim o tom! já aponta em mim o ritmo, os primeiros acordes... só precisas soprar-me as palavras certas! só precisas ecoar-me com o teu canto e aceno a melhor disposição para o que devo falar e gesticular!
o ato já iniciou, minha deusa! a cena está aberta! é a hora! vem! vem! ressurges de onde quer que estejas! traga de volta o suspiro mais emocionado! a direção com a luz mais propícia! a condição de frescor! a pele com adrenalina! a suave energia que me falta para dormir e sonhar! me faça de conexões, me freqüente com assiduidade! embalsama-me no óleo mais fértil! proclama-me tua!
já não sou daqui, não gosto de futebol e abomino as leis do tráfego!
quero a latência das mãos de Pollock! uma tela no chão... caminharei sobre ela! e te prometo, te prometo, minha doce sereia, tocarei o piano sem partitura!
arrepio! o teu espectro... movimentou-se! senti sobre o ombro a tua morna mão. estás aqui!
estenda-se a tela! estenda-se a tela! estenda-se a tela! enfim, enfim...
eu mesma vou, correndo, buscaras as tintas!

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