sábado, maio 06, 2006

o pouso


Não fazia muito que o avião pousara... O tempo foi o de deixar as malas em casa e tomar um táxi até o lugar onde queria estar!
Era início de noite, a viagem havia sido longa e eu já não a via por um bom tempo. A lua cheia e amarelada. as chaves do apartamento haviam ficado comigo; eu simplesmente abri a porta! O apartamento estava escuro já. Fui até a cama, relaxei as costas cansadas. A previsão era a de que ela chegasse em seguida.
Então... um tempo depois, ela abriu a porta. Acendeu a luz do hall e entrou. Todos os dias ela chegava diferente- humor variável- e naquele, estava silenciosíssima! Eu, esperava o momento que ela me visse, ali, deitada sobre a sua cama, recém acordada, pregressa do intervalo de realidades, o qual pertence o ato de dormir. Saída do estado de vigília, segundo Freud, rumo ao inconsciente. Mas isso não importava, era só um desejo íntimo meu e a realidade, dificilemente, é condizente com as nossas tantas expectativas, não achas? Eu estava acordada, enfim e apenas tentando relaxar...
um tempo depois, ouvi a fechadura, era ela! As luzes do hall acenderam e a porta fechou. eu sabia que ela chegava todos os dias diferente- humor variável- e nesse dia, em especial, a percebi silenciosíssima...
Ela passou então, pelo living e por certo que, agora, viria até o quarto! ui! ai! - ah... calma coração! ela entrou no banheiro, e fechou a porta? Ah que engraçado; até parece que ela desconfia ter alguém em casa, ou então, porque a porta do banheiro fechada? Eu não queria falar com ela, em definitivo. Não queria, num primeiro momento, que ela me soubesse ali, queria sim, saber como ela estava, com quem falava, como se dava a sua rotina... suavizando assim, a minha chegada! Saber onde era mesmo que eu estava chegando.

Tentei aguçar mais o ouvido. Ouvi um ruído constante vindo do living. Ela estava no banheiro, será que poderia ouvir? Quando eu já pensava desistir de ficar às escusas e ir ver, enfim, o que é que era; ouvi a porta do banheiro abrir... ela foi atender o telefone celular- era esse o barulho que eu ouvia.
Falava manso, em tom de cumplicidade. Sorria harmônica. Eu, tentava descobrir com quem falava. Ela entrou de novo no banheiro, acompanhada, agora, pela conversa ao telefone: poderíamos marcar para as nove?! o que acontece é que eu acabei de chegar em casa e ainda tenho que tomar um banho... mas prometo chegar aí para experimentar o licor. E, por favor, sem personagens nessa hora, ok?
Hum, com quem será que falava? E continuava: levarei os relatórios com as primeiras impressões...
Ah, é claro, só poderia, ser! Era o novo diretor com que trabalhava! Aposto que ele devia estar marcando um daqueles ensaios noturnos para hoje à noite, justo hoje à noite!

Nem mesmo consegui perceber como acabara a conversa, mas ouvi um suspiro de alívio dela e a sua respiração cada vez mais perto, mais perto... quando pude perceber ela estava tirando a blusa em frente à cama. Seios nus, pequenos, cabelos soltos e a calça jeans que eu adoro!
Ela me viu, enfim!
Devo ter ficado atônita! Soltou os braços demoradamente... num longo movimento. Paralisou por um momento e sorriu- o sorriso mais nervoso que já vi brotar-lhe dos lábios. Disse, em tom sussurrado: não imaginei que estivesses aqui! E num impulso, deitou-se sobre mim, num longo abraço, cabeça no peito. Senti o peso do corpo dela, senti o cheiro que era diferente. Não tinha mais o costumeiro e afrodisíaco, cheiro de pitanga. Era, agora um cheiro um tanto mais amadeirado sobre a pele. Audacioso... estava mais branca, e eu, igualmente devia estar mais pálida...
O tempo, de fato havia passado. Estávamos diferentes, as duas. Os gestos não tinham o mesmo brilho de quando nos despedimos. Tinha muito de espanto agora, de reconhecimento. O apartamento estava escurecido e sem música. Propus uma. Em seguida propus uma bebida- a saída para aquela intimidade com referência antiga.
Recomecemos! (como se isso fosse possível em vida real.. não se tratava de um sonho! Freud, Freud... já estava feito! em realidade! vigilante!) mesmo assim, levantamos as duas juntas, harmônicas. Estávamos dispostas, ahm? Ela falava do meu cabelo e eu beijava o seu pescoço. Fumamos um cigarro atentas, sobre o tapete do living.
Foi na hora de nos despedirmos que pudemos relaxar mais. Agora as horas seriam marcadas. O ensaio era, mesmo, para aquela noite.
E eu, desfaria a malas, com urgência!

Um comentário:

Anônimo disse...

Perfeito! Não cai no meloso, nem no dramático demais, não é apelativo, não invade o leitor, só convida!

E o leitor, se é esperto, aceita o convite.