segunda-feira, novembro 27, 2006

todo dia ainda de pé!

toda rosa é rosa porque assim ela é chamada... eu fiz de tudo pra você perceber que era eu!
(by Carina Sehn. Bonfim/Porto Alegre/Novembro 2006)

caetano cornucópico e roxo!


Novo trabalho, novo amor, novo ciclo, novo cio: “você nem vai me reconhecer quando eu passar por você, de cara alegre cruel feliz e mau com o meu pau duro”. Caetano no seu novo trabalho, junto com Pedro Sá (guitarra), Marcelo Callado (baixo e teclado) e Ricardo Dias Gomes (bateria), traz à baila “Cê” – Um disco de cor roxa, lançado em vinil e em cd!
Um Caetano mesclado, reelaborado, com uma voz madurésima, afinadíssima! Com certeza é um momento de ressurreição, de velas acesas num grande ritual às avessas, pois violento, viril, pagão, cru.
As letras parecem que o estão libertando, o fazendo gozar, como na faixa Porque?, que Caetano canta num “mantra” luso: “estou me a vir”! Parece estar se vingando dele mesmo, daquele seu eu confessadamente romântico, enfrenta-o vestindo-o com ironia . Pra quem pensou que ele andava sem sal, voltou guardado em conserva! Cheio de sabor! Pleno de sentido, sozinho! É visível que o artista está exposto, dolorido: “eu sou herói, só deus e eu sabemos como dói!”, mas acima de qualquer coisa sensual, erótico, vivo, danado: “Veio a maior cornucópia de mulheres, todas mucosas pra mim, o mar se abriu pelo meio dos prazeres, dunas de ouro e marfim!”
Caetano, que nunca foi unanimidade, salta de pára-quedas, cai cheio de lágrimas rasgando com a guitarra qualquer véu do conformismo, bem no centro do prazer, bem em cima de nós! Num ritual, agora sim, de prazer sem medida, de quem já experimentou e quer agora tudo de bom e ruim. Sem tempo pra perder!
Preparado para sentir? Preparado para comer e ser comido? Sejamos mais antropofágicos sem dar letra, sem dar mole pra ratoeira! Heterodoxamente mais híbridos! Mais mucosas, mais pele, mais penetráveis!
“e tu? como é que te tens por dentro? Porque não te vens também?”

sábado, novembro 25, 2006

vuelve el tango!



Duas noites que não consigo dormir... lençol revirado... cobertor quente demais...um travesseiro desconfortável e o outro entre as pernas - dizem que auxilia na postura! Dores por todo o corpo. Espera. Angústia pouca. Vento gravíssimo.
Não teve nenhum assassinato e a luz continua acesa. Sem medos.
O motivo? ah, tenho insônia porque... Quá! Se eu o soubesse provavelmente não teria mais insônia! Amanhã passo o dia moída, sem energia e sem pausa para uma sesta. Hum, ter insônia só quando eu quisesse: então, hoje vou dormir só as 6 da manhã!
E quando eu saio com os amigos que bem deu 1 hora da manhã e eu sou invadida por uma sensação de: preciso voltar pra casa, amanhã quero acordar cedo, organizar tudo e ir pra feira! Como se sempre tivesse muitas coisas pra organizar...! A casa está em ordem, moro sozinha, sou um tanto obsessiva com as coisas estarem ou não nos seus lugares, mas a sensação é invasiva... Só pode ser obra desse sentimento retardado, desse antepassado duvidoso e evidentemente ariano na cor e na pele. Sou ré de mim mesma! Iconfessa! Equivocada!
Improvável me encontrar se eu não quiser te ver! Bem difícil alguém ser visto quando não quer ser visto. Só se a pessoa é uma dessas criaturas sem sorte e com azar que passa na frente da casa do inimigo sem nem mesmo saber que ele mora ali. Ou aparece no bar com a amante bem no dia em que uma amiga distante leva a esposa pra jantar nesse mesmo restaurante. Improvável! Mas acontece, é só ter um pouquinho de azar pra vida se mostrar plena! Gorda vida cheia de guloseimas e azedumes! Vida em conserva, sempre com gosto forte!
Café... prefiro gosto de café! Que venha o dia!

terça-feira, novembro 14, 2006

Ainda sob efeito do sono. Manhã. Cedo. Rodoviária. Espera para entrar no ônibus. Na minha frente a vassoura da limpeza pública mexe de um lado para o outro. Uma técnica que quase remove os meus pés do chão para alcançar embaixo do banco, para capturar restos de cigarros e sujeiras soltas. Movimentos circulares com um final de repuxo, impulso para a próxima vassourada. Vem, vai e puxa! Vem, vai e puxa! Vassoura de ferro, lã e mola. Um forte choacalhão para livrar-se da sujeira e de novo outro círculo e outra puxada.
Demoro vendo a moça negra que varre. Nos seus olhos um quê de indiferença aos que como eu esperam o seu ônibus. Importa-lhe a sujeira, cada grão, cada ponta de cigarro e os pés e as malas pouco lhe importam, queria mesmo era que fossem todos embora! Concentração ascética- concentração invejável! Me chama a atenção a falta de água no seu ofício que apenas remove a superfície. Dá a parência. Concentração de aparência? Isso não! Ela quase varreu os meus pés! Poeira, círculos e repuxos! O cabelo dela preso e as mãos sisudas. De Box em Box. De pés em pés. De banco em banco. Momento breve. Passageiro. Definitivamente passageiro! Espera. Entrega da passagem na mão do motorista. Bom dia. Nenhuma despedida. Volta breve, moça negra que varre!

segunda-feira, novembro 06, 2006

lembra, lembra, lembra.

o que é mesmo que você tem por dentro? pensa na beira do mar, pensa. sabe aqueles rostos empalhados do filósofos nos livros, com contorno de bronze ou mesmo em monumentais estátuas frias e com limo? o que é que você tem por dentro? corpo, 70% água correndo, fluindo breve em movimentadas partículas espessas entre os órgãos um após o outro espessos, normalizados. sucessão de amplificados sons batendo de um lado para o outro no centro. até se chegar na cidadezinha do interior leva-se a noite toda! é melhor pôr calça comprida que faz frio debaixo dos pés. o cinto da calça abriu de vez. congelei só para passar pela porta. lá dentro além do piano parado, corria solta a fotografia em cima do sofá. mesmo depois de tanto tempo os móveis estavam limpos... alguém esteve aqui! ainda está! aguardam-me na última hora. água rasa. pequenos olhos grandes. por dentro, foi o que perguntaste? indo pelas frestas, virou limo. escorreguei antes de rezar. cheia de sal e de sol. como se beijar fosse somente sem os olhos verem... penso na beira do mar. um longo silêncio antes de conversar com a platéia bem da boca de cena. bem descontraída- falsa intimidade espetacular! é melhor fechar a cortina da janela. lembra?

quarta-feira, novembro 01, 2006

afinal.


Te vi ainda de costas. Arrumei os meus anéis.
Hoje cortei toda a grama verde amarelada. Ninguém percebeu nada, a casa vazia.Te vi. Sabe aquele som de porto, de cais quando o navio se aproxima? De vez ancorei a tal saudade. Descuidei ou por não sei nem o quê, você continuou de costas. Percebi que o meu tênis estava desamarrado. Abaixei e refiz o tope, o nó. Tempestade em mim. Nem você, nem ninguém ouviu o sax que se confundia no prédio ao lado. Devia ser um desses músicos que acabou de chegar em mais um desses constantes navios. Eles chegam, tocam pra tentar descobrir a bossa-nova e não a encontrando, não recebendo o divino tom, vão embora assim que o dia amanhece!
Quando não se é percebido, quando a nota não sai, é melhor mesmo entrar no navio pra partir. Voltar. Qualquer coisa dessas que movimentam grandes espaços de tempo.Ir pelo oceano pode ser o mais vantajoso para quem passa a maior parte do tempo em terra firme. Afinal. Recolhi a grama que cortei, juntei-a e coloquei num saco preto. Colocar num saco preto pode até ser lona de circo, mas sem as estrelas. As minhas constelações deixaram de brilhar pra quando você virasse de frente não se cegasse. Parei ali, bem ali. Viras-te enfim. Âncora ao mar. Vento permanece na plataforma. O sax parou nesse instante.