domingo, setembro 10, 2006

o pop overexplorado

O que é que você sabe fazer, hein?
João Ricardo e a Cia. Espaço em Branco em sua mais nova montagem - Andy/Edie - sabem ser eles mesmos com autenticidade.
Num período histórico onde ‘qualidade de vida’ é ser aceito e reconhecido pelos meios de comunicação e mídia, onde o sujeito vem em massa e em série - Andy/Edie explora um ambiente de famosos, de fama, de jogos de poder na direção de tornar-se uma celebridade. Usando a idéia de obra de arte como pano de fundo, mais precisamente a Pop Art e o seu expoente maior - Andy Warhol, vemos em cena personalidades objetalizadas, buscando o reconhecimento da sua autonomia de expressão, de sentimento e de beleza. A motivação, para tanto, está em Andy Warhol e no seu atelier de criação, a Factory, espaço este que transforma o Teatro de Arena e lhe dá um novo look assumidamente underground e pop.
Somos convidados a entrar nessa fábrica encantada das celebridades comandadas por Warhol, num circuito de televisores, ligares em série e que capturam imagens ao vivo, aparecem as primeiras expressões e cenas de um concorrido debut com lindos rostos atônitos pela chance de protagonizar, de ser eleito como pop star. O desejo frenético e capaz de enfrentar os limites do corpo até ser amado e veiculado como ‘a nova tendência do mercado’.
João Ricardo num trabalho de direção voltado para o ator, explora o humano fazendo aparecer nos seus seis atores a complexidade de sentir, de ser corajoso e imponente frente a um ambiente visivelmente hipócrita-irônico. Vemos em cena sensibilidade aglutinada (a ponto de bala), momentos entrecortados de clímax e anti-clímax, uma seqüência de cenas a partir do andar livre dos atores num terreno amplamente corporal e que busca a forma com conteúdo, contendo matéria viva e humana.
São seis diferentes formas, distintos corpos e um desejo único de ser eles mesmos. Os objetos são exatamente esses seis corpos e a sua exploração consciente. O texto é comandado pelo self de cada um deles, projetando em cada fala autenticidade e maior proximidade com o público. Os atores se valem de uma persona(agem) e oferecem o seu corpo como vitrine, como passarela para o desfile desse outro, pouco existindo de interpretação, mas sim de individuação.
Como eu não havia percebido antes que sendo eu; com esse meu cabelo, rosto e corpo tenho o aval necessário para ser exclusivo? Warhol sabe disso e produz em série as excentricidades de cada um. Se uma garrafa de Coca-Cola ou uma embalagem de sopas Campbell’s é por ele transformada em objeto de arte, da mesma forma o homem o pode ser.
O ator Rodrigo Scalari está no papel de Andy Warhol, com uma atuação leve, intercalada por variadas nuances de intenção e transparência no estilo. Extravagante, Rodrigo assume a afetação de Andy, sem esquecer os seus propósitos perante a arte, sem esquecer toda a sua contribuição humana para tanto. Sissi Venturim, numa atuação pungente, é Edie Sedgwick. Ela faz brilhar e leva a sua personagem às cinzas, fusionando o seu corpo com o da personagem numa viagem sensitiva até os seus limites físico-emocionais. Com Alexandra Dias e Michel Capelletti o espaço ganha corpos ‘performáticos’ que desvelam ao público boa parte da intimidade dos seus personagens, através de recortes corporais quase expressionistas. Lisandro Bellotto traz a sua espontaneidade para dentro da cena e Ravena Dutra contorna-a com mistério e beleza.
Andy/Edie conta com um texto atual, inteligente e despojado do jovem dramaturgo porto alegrense Diones Camargo, o qual recebeu o segundo lugar do Prêmio Nacional de Dramaturgia da Funarte 2005. A iluminação é de Jô Fontana e dá todo o glamour para o desfile dos pop stars.
Por fim, que acendam as luzes para Andy Warhol e a sua fábrica mágica da criação! Ao apertar um dos botões da mesa de luz – voilà - passamos de um lugar comum, em meio à multidão, a um outro pleno de atitude, mix e autenticidade.
Frente à frente, uma realidade de homens massificados e em série, e outra, portadora de indivíduos conscientes do seu corpo, individualidade e de toda a diferença que isso faz.
O que é que você sabe fazer? Ou melhor ainda: o que é que você sabe ser?

Um comentário:

quasechuva disse...

o maximo que posso fazer é que meus ossos valham a pena
que é tão leve
fazendo meu peso se desmedir