segunda-feira, junho 03, 2013

discurso pagão xamânico gaúcho

Este texto performático produzi para o festival de performance LAPSO da Vai!Cia de Teatro que se realizou no último sábado no apartamento do João Pedro Madureira, diretor da cia. Foram intensas 13h de performance onde a minha ação encerrou o festival às 7h da manhã quando nascia o dia. Invoquei o Escudo do Leste, o dourado da percepção e da nova consciência, a troca de pele, o renascimento, a cobra performática durante a chuva e quando vimos o céu inteiro ficou dourado! O céu se abriu enquanto estávamos ali com o Leste e, logo que a ação encerrou, o dourado foi-se embora e deu lugar a uma chuva calma e gloriosa com raios luminosos e certeiros. Como disse a Sofia Ferreira, estamos certos, está tudo certo! A natureza confirmava tudo ali na nossa frente! 
Adorei fazer, estar e mudar ali, com todos. 





Escudo do leste, sábado. Início do dia. Ogum vem com sua espada, monta e muda os estratos duros, evangélicos-cristãos e renascentistas. O que antes inebriava agora irradia. Aqui onde se viveu uma noite espessa de maravilhas, aqui onde a arte se manifestou toda, articulou Brasil e mundo, restabeleceu conexões, fez movimentos escusos, irregulares, políticos, efervescentes. Onde o corpo foi lugar de acontecimento, de conexão com a política grossa gaúcha, com o vento minuano batendo na soleira das canelas, com o bigode sendo passado a ferro pelos ditadores deste ainda colônia Brasil que mata as suas árvores à custa de mais dólares entrando pela porta de trás. Pelo olho do Cú! Rio grande de tantos pagos e chulas onde muito peão se sbriu inteiro, onde muita prensa beia outra prenda, onde o bem-te-vi inicia mais um dia. canta pra subir até o dourado, alcançar outros níveis de percepção e compreensão. Cobra, cobra da vida nova, que troca de pele_ performer da natureza. Cobra-performer que traça um novo caminho, uma nova sensibilidade.
Eu xamã do leste invito a serpiente, snake, cascavel, víbora, performeros e performeras, performers, artists que estão prestes a se transformar, a nascer de novo, a  mudar de pele, a sair da casca, a respirar difetente para iniciar um novo dia comigo, para abrir o coração ao amarelo dourado que habita a águia!

Há que se trocar, cambiar os antigos hábitos, permitir a morte e o renascimento que vem com ela, que é ela. Trasmutemos os nossos próprios venenos, troquemos com o outro, toquemos nele como se fosse  primeira vez, como se não soubéssemos como é um corpo humano, como ele respira, como ele se movimenta. O corpo do outro é a matéria a ser pesquisada pelo performer, o corpo do outro como um mistério, como um espaço sagrado energético que só poderemos tocar se trocarmos a nossa energia com a dele. Se a nossa energia entrar pelos seus poros, se o nosso corpo estiver com o corpo do outro.
O performer é corpo, energia, matéria e não-matéria, ciência, arte e pensamento. O performer é cobra, sol. Pura energia para ser partilhada.
E tudo isto é criação, é o todo do universo em nós. Somos uma cachoeira de signos, não paramos de comunicar um só momento. Temos um  corpo mágico pleno de sentidos. A nossa magia é poderosa e guerreira. Nunca paramos de mudar, de ferver, de produzir combustão. A arte da performance é uma cobra, um fogo fátuo, uma montanha para um xamã.
Aqui do início deste dia, destas 12 horas de arte, eu, Carina Sehn, artista de performance mudo de pele, todos mudamos. O apartamento se inunda de luz e os pássaros cantam a abertura do portal dourado da percepção.
Renascemos pela performance, pela energia da troca entre corpos, pelo nosso corpo lugar de todos os acontecimentos, pela vida que respira aqui, ali e dentro. Pelo tempo puro que não se constitui de passado presente e futuro, mas sim, de aqui e agora!

Xamã do Leste _ por Carina Sehn.